A Unicamp e a América Latina
Talvez seja um lugar-comum dizer que a integração latino-americana não se fará sem sua equivalente aproximação nos campos da ciência e tecnologia, mas fazê-lo e para tanto superar o isolamento cultural de nossos países – e por extensão de nossos centros de ensino superior e de pesquisa – é algo que ainda representa um difícil desafio. Esta reflexão perpassou todo o transcurso de um recente seminário internacional sobre ciência e tecnologia na América Latina, terceiro de uma série que a Unicamp vem realizado desde 2004 sob organização de sua Coordenadoria de Relações nternacionais. O tema foi, não por acaso, “a universidade como promotora do desenvolvimento sustentável”, e ali a Unicamp cuidou de oferecer sua experiência naquilo em que vem se notabilizando ao longo de sua história – completou quarenta anos em outubro de 2006 –, isto é, na capacidade de transferir à sociedade os frutos de seu conhecimento gerado.
A Unicamp sempre manteve a América Latina no seu campo de interesse acadêmico – de que é prova o grande número de estudos e teses sobre o continente e sua multifacetada realidade – sem esquecer o fato de que parte expressiva de seus docentes, bem como de seus alunos estrangeiros, provém dos países vizinhos. Nos últimos três anos, entretanto, esse esforço de aproximação cresceu e ganhou expressão programática. Entre as numerosas iniciativas tomadas a partir de 2003 destacam-se, além do citado seminário anual sobre ciência e tecnologia, a adoção de uma política de proveitamento sistemático dos programas de cooperação oferecidos pelas agências de fomento – sobretudo a Capes –, o envio de missões de trabalho a instituições da Argentina, do Chile, Uruguai e Cuba, a intensificação do intercâmbio de estudantes e, há três anos, a criação de uma cátedra de estudos brasileiros e argentinos com a Universidade de Buenos Aires, tal como foi feito com instituições de Espanha e Portugal.
A universidade latino-americana é heterogênea e seus interesses são, por vezes, marcadamente distintos. Mas há desafios e peculiaridades comuns que aproximam suas instituições e estes devem ser levados em conta quando se trata de atuar em conjunto. Os desafios certamente passam pela necessidade de conjugar sua importância qualitativa com a quantitativa – em face da pressão por mais vagas nos cursos de graduação e de pós-graduação – , reduzir suas taxas de evasão e, talvez o maior desafio de todos, assegurar a contínua qualificação acadêmica de docentes e pesquisadores.
É um fato que contamos hoje com umas poucas universidades com um patamar de titulação docente que se aproxima de 100% (é o caso da Unicamp, que tem 96% de seus docentes com titulação mínima de doutor), o que lhes dá inserção internacional e assegura interlocução científica ampla. Presume-se que para que instituições de primeira ordem assegurem seus padrões de compatibilidade (onde eles existem) é indispensável que mantenham no exterior, rotativamente, em torno de 10% de seu corpo docente para atualização ou participação em programas de cooperação relevantes. Claramente, no horizonte da universidade latino-americana, é preciso alargar esse espectro.
Nesse sentido, é importante que os programas de cooperação e intercâmbio contemplem o que cada instituição tem de melhor. No caso da Unicamp, sua vocação para um ensino fortemente associado à pesquisa e à extensão permitiu o desenvolvi mento de modelos próprios que compõem, atualmente, o eixo de seu diálogo com as co-irmãs latino-americanas. A densidade e o volume de suas pesquisas geraram uma pós-graduação qualificada que hoje representa 48% de seu alunado – proporção inédita na América Latina – e 12% de toda a pós brasileira. É relevante o fato de que a Unicamp produziu 874 doutores e 1.187 mestres em 2005, números comparáveis aos das melhores universidades americanas. Por outro lado, sua graduação é potenciada por aproximadamente 1 mil bolsas de iniciação científica e por uma estrutura de 20 empresas juniores que congrega milhares de alunos de praticamente todas as unidades de ensino, num esforço de aprendizado extracurricular que tem ainda a vantagem de aproximá-los do mercado de trabalho, quando não da cultura do empreendedorismo. Levantamento recente mostra que somente na região de Campinas quase uma centena de empresas de pequeno e médio porte — nas áreas de tecnologia da informação, engenharias, biotec nologia, laser e óptica — têm à sua frente exalunos da universidade.
São características importantes no plano da troca de experiências. Não por acaso, a experiência da Agência de Inovação (Inova) da Unicamp, criada há três anos para facilitar a transferência de tecnologia e o estabelecimento de parcerias estratégicas com os setores empresarial e público, despertou o interesse de universidades argentinas, chilenas e uruguaias, que estudam a reprodução do modelo. Chama também a atenção dos parceiros latino-americanos, ainda no contexto da Inova, a adoção pela Unicamp de uma política decisiva de valorização da propriedade intelectual, graças à qual a universidade subiu recentemente ao topo da lista dos maiores patenteadores brasileiros, até então liderada pela maior empresa nacional, a Petrobras. Mais importante que o depósito de patentes, entretanto, é o crescente o volume de licenciamentos – isto é, sua transferência à indústria ou a outros setores de produção de bens e serviços – que a Unicamp tem conseguido nos últimos anos.
Falou-se, acima, das peculiaridades da universidade latino-americana – sobretudo da universidade pública. Destas, talvez a mais marcante seja que, como nenhuma outra no mundo, ela se caracteriza por desempenhar tarefas que vão além do ensino e da pesquisa. Freqüentemente é levada a buscar solução para problemas sociais emergentes, geralmente onde o Estado falha. De norte a sul do continente, é irrecusável seu envolvimento na gestação de programas e políticas públicas no plano da saúde, da educação, da cultura e da inclusão tecnológica, entre outros, muitos dos quais são incorporados pelos governos e reproduzidos em larga escala. Este é talvez o capítulo menos explorado da história – tão recente quanto promissora – da cooperação entre as universidades latino-americanas. E é um campo onde a Unicamp, além do que foi aqui mencionado, tem ainda muito a oferecer.
A Unicamp sempre manteve a América Latina no seu campo de interesse acadêmico – de que é prova o grande número de estudos e teses sobre o continente e sua multifacetada realidade – sem esquecer o fato de que parte expressiva de seus docentes, bem como de seus alunos estrangeiros, provém dos países vizinhos. Nos últimos três anos, entretanto, esse esforço de aproximação cresceu e ganhou expressão programática. Entre as numerosas iniciativas tomadas a partir de 2003 destacam-se, além do citado seminário anual sobre ciência e tecnologia, a adoção de uma política de proveitamento sistemático dos programas de cooperação oferecidos pelas agências de fomento – sobretudo a Capes –, o envio de missões de trabalho a instituições da Argentina, do Chile, Uruguai e Cuba, a intensificação do intercâmbio de estudantes e, há três anos, a criação de uma cátedra de estudos brasileiros e argentinos com a Universidade de Buenos Aires, tal como foi feito com instituições de Espanha e Portugal.
A universidade latino-americana é heterogênea e seus interesses são, por vezes, marcadamente distintos. Mas há desafios e peculiaridades comuns que aproximam suas instituições e estes devem ser levados em conta quando se trata de atuar em conjunto. Os desafios certamente passam pela necessidade de conjugar sua importância qualitativa com a quantitativa – em face da pressão por mais vagas nos cursos de graduação e de pós-graduação – , reduzir suas taxas de evasão e, talvez o maior desafio de todos, assegurar a contínua qualificação acadêmica de docentes e pesquisadores.
É um fato que contamos hoje com umas poucas universidades com um patamar de titulação docente que se aproxima de 100% (é o caso da Unicamp, que tem 96% de seus docentes com titulação mínima de doutor), o que lhes dá inserção internacional e assegura interlocução científica ampla. Presume-se que para que instituições de primeira ordem assegurem seus padrões de compatibilidade (onde eles existem) é indispensável que mantenham no exterior, rotativamente, em torno de 10% de seu corpo docente para atualização ou participação em programas de cooperação relevantes. Claramente, no horizonte da universidade latino-americana, é preciso alargar esse espectro.
Nesse sentido, é importante que os programas de cooperação e intercâmbio contemplem o que cada instituição tem de melhor. No caso da Unicamp, sua vocação para um ensino fortemente associado à pesquisa e à extensão permitiu o desenvolvi mento de modelos próprios que compõem, atualmente, o eixo de seu diálogo com as co-irmãs latino-americanas. A densidade e o volume de suas pesquisas geraram uma pós-graduação qualificada que hoje representa 48% de seu alunado – proporção inédita na América Latina – e 12% de toda a pós brasileira. É relevante o fato de que a Unicamp produziu 874 doutores e 1.187 mestres em 2005, números comparáveis aos das melhores universidades americanas. Por outro lado, sua graduação é potenciada por aproximadamente 1 mil bolsas de iniciação científica e por uma estrutura de 20 empresas juniores que congrega milhares de alunos de praticamente todas as unidades de ensino, num esforço de aprendizado extracurricular que tem ainda a vantagem de aproximá-los do mercado de trabalho, quando não da cultura do empreendedorismo. Levantamento recente mostra que somente na região de Campinas quase uma centena de empresas de pequeno e médio porte — nas áreas de tecnologia da informação, engenharias, biotec nologia, laser e óptica — têm à sua frente exalunos da universidade.
São características importantes no plano da troca de experiências. Não por acaso, a experiência da Agência de Inovação (Inova) da Unicamp, criada há três anos para facilitar a transferência de tecnologia e o estabelecimento de parcerias estratégicas com os setores empresarial e público, despertou o interesse de universidades argentinas, chilenas e uruguaias, que estudam a reprodução do modelo. Chama também a atenção dos parceiros latino-americanos, ainda no contexto da Inova, a adoção pela Unicamp de uma política decisiva de valorização da propriedade intelectual, graças à qual a universidade subiu recentemente ao topo da lista dos maiores patenteadores brasileiros, até então liderada pela maior empresa nacional, a Petrobras. Mais importante que o depósito de patentes, entretanto, é o crescente o volume de licenciamentos – isto é, sua transferência à indústria ou a outros setores de produção de bens e serviços – que a Unicamp tem conseguido nos últimos anos.
Falou-se, acima, das peculiaridades da universidade latino-americana – sobretudo da universidade pública. Destas, talvez a mais marcante seja que, como nenhuma outra no mundo, ela se caracteriza por desempenhar tarefas que vão além do ensino e da pesquisa. Freqüentemente é levada a buscar solução para problemas sociais emergentes, geralmente onde o Estado falha. De norte a sul do continente, é irrecusável seu envolvimento na gestação de programas e políticas públicas no plano da saúde, da educação, da cultura e da inclusão tecnológica, entre outros, muitos dos quais são incorporados pelos governos e reproduzidos em larga escala. Este é talvez o capítulo menos explorado da história – tão recente quanto promissora – da cooperação entre as universidades latino-americanas. E é um campo onde a Unicamp, além do que foi aqui mencionado, tem ainda muito a oferecer.
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