5.12.06

Língua
Caetano Veloso

Gosto de sentir a minha língua roçar A língua de Luís de Camões Gosto de ser e de estar E quero me dedicar A criar confusões de prosódias E uma profusão de paródias Que encurtem dores E furtem cores como camaleões Gosto do Pessoa na pessoa Da rosa no Rosa E sei que a poesia está para a prosa Assim como o amor está para a amizade E quem há de negar que esta lhe é superior E deixa os portugais morrerem à míngua "Minha pátria é minha língua" Fala mangueira! Fala! Flor do Lácio Sambódromo Lusamérica latim em pó O que quer O que pode Esta língua? Vamos atentar para a sintaxe dos paulistas E o falso inglês relax dos surfistas Sejamos imperialistas Vamos na velô da dicção choo choo de Carmen Miranda E que o Chico Buarque de Holanda nos resgate E - xeque-mate - explique-nos Luanda Ouçamos com atenção os deles e os delas da TV Globo Sejamos o lobo do lobo do homen Adoro nomes Nomes em à De coisas como Rã e Imã Nomes de nomes Como Scarlet Moon Chevalier Glauco Matoso e Arrigo Barnabé e maria da Fé e Arrigo barnabé Flor do Lácio Sambódromo Lusamérica latim em pó O que quer O que pode Esta língua? Incrível É melhor fazer um canção Está provado que só é possível Filosofar em alemão Se você tem uma idéia incrível É melhor fazer um canção Está provado que só é possível Filosofar em alemão Blitz quer dizer corísco Hollyood quer dizer Azevedo E o Recôncavo, e o Recôncavo, e o Recôncavo Meu medo! A língua é minha pátria E eu não tenho pátria: tenho mátria E quero frátria Poesia concreta e prosa caótica Ótica futura Samba -rap, chic-left com banana Será que ela está no Pão de Açúcar? Tá craude brô você e tu lhe amo Qué queu te faço, nego? Bote ligeiro Nós canto-falamos como que inveja negros Que sofrem horrores no gueto do Harlem Lívros, discos, vídeos à mancheia E deixe que digam, que pensem e que falem
Língua Portuguesa
Olavo Bilac
Última flor do Lácio, inculta e bela, És, a um tempo, esplendor e sepultura: Ouro nativo, que na ganga impura A bruta mina entre os cascalhos vela...
Amo-te assim, desconhecida e obscura, Tuba de alto clangor, lira singela, Que tens o trom e o silvo da procela E o arrolo da saudade e da ternura!
Amo o teu viço agreste e o teu aroma De virgens selvas e de oceano largo! Amo-te, ó rude e doloroso idioma,
Em que da voz materna ouvi: "meu filho!" E em que Camões chorou, no exílio amargo, O gênio sem ventura e o amor sem brilho!

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